sábado, abril 18, 2009

Breve Tratado do Silêncio

Eu, o sonho e o pesadelo, a utopia e o verdadeiro, ordeno silêncio em torno de mim.
Promulgo a lei que fará soar a paz.
E assim se cumpra a minha vontade:

Que se calem os benditos, os bem-aventurados e os felizes.
Que se calem os mestres, os sábios e os sabichões.
Que se calem os bem-sucedidos, os belos e os campeões.

Não quero ouvir um pensamento ou um conselho.
Mesmo que caia no poço do erro, a minha vontade é lá cair.
É errar. Ouviram…

Não quero saber das afirmações ou das certezas.
Mesmo que viva no reino da dúvida e da incerteza;
Mesmo que diga tolices ou mentiras -
Não há mal que daí nasça - é nelas que eu acredito.

Sim, eu sei que muito penso e nada faço.
Mas também nunca desejei fazer nada.
Sim, eu sei que sou o trapo que não se veste.
Mas também não sou peça de arrebique.
Sim, eu sei que não sou ninguém.
Mas quem é que disse que eu queria ser alguém?

Que falso pensarem que quero orientação.
Que não quero ser o que sou.
Que não quero estar aonde estou.
Sabem lá eles que o meu lugar é aonde eles não estão.
É à sombra da minha solidão.

E assim decreto a lei do não escutar.
E dou vivas aos incautos, aos ridículos, aos loucos e aos vagabundos.
Dou vivas aos solitários, aos que não são de companhia, aos que querem a sua própria companhia.
Dou vivas aos que se querem ouvir, aos que não querem escutar, aos que se querem rir, aos que se querem calar.

Dou uma pancada na mesa e termino a sessão.
E boto a baixo o licor
Que nasceu do silêncio e da solidão.